Fotos e
texto por Repórter de Campo Frida da Silva
A cidade já
respira o ar perverso dos megaeventos. O último domingo foi marcado por ações
coordenadas de propaganda, repressão e maquiagem urbana, orquestradas pela
prefeitura, pelo governo do Estado e pelos patrocinadores dos eventos que a
cidade receberá a partir do ano que vem.
Logo após o amanhecer cinzento, às 7h,
veio abaixo, em apenas cinco segundos,
o primeiro trecho da Perimetral, cuja demolição vai custar mais de R$
500 milhões – parte de um projeto orçado em R$ 7,7 bi para a chamada "revitalização"
do Porto. Enquanto prefeito, vice-governador e afins ainda comemoravam a
implosão, mais de 600 homens da Polícia Militar, incluindo o Batalhão de
Choque, patrulhavam a praia e revistavam frequentadores "suspeitos",
para reprimir supostos "arrastões". No fim da tarde, a massa
desavisada das classes média e baixa batia palmas para um show da campanha de
marketing do novo uniforme da seleção brasileira, enquanto algumas dezenas de ativistas protestavam contra os gastos de mais de R$30 bi com a Copa, e outros
promoviam um ato político-artístico-cultural no Ocupa Lapa.
O fim de
semana foi uma pequena prova do que vem por aí em breve. Vale tudo pela
"segurança" dos grandes eventos, inclusive o desrespeito aos direitos
básicos dos cidadãos cariocas de ir e vir da praia, já que a polícia passa
agora a revistar até os ônibus que saem de bairros da Zona Norte da cidade em
direção às praias da Zona Sul, numa ação preconceituosa contra a classe
trabalhadora que tem na praia seu principal local de lazer. O esquema montado
para o patrulhamento da orla é uma espécie de treino das tropas para atuarem
nos megaeventos, com testes de equipamentos de monitoramento por câmeras de
última geração e um efetivo enorme para reprimir pequenos furtos. Furtos estes
que sempre ocorreram nas praias, mas que, agora, são os vilões da vez no cenário carioca e tornaram-se a pauta
principal das políticas de segurança do Estado nas últimas semanas, com vistas
à garantia de uma suposta "paz" para a circulação de turistas e
atletas que visitarão as praias e ficarão hospedados em hotéis da região.
Também vale
tudo para levar a cabo um projeto bilionário de maquiagem da arquitetura
carioca no Porto, que vai beneficiar diversas empresas, sobretudo construtoras,
as quais lucram para derrubar a Perimetral e construir um "novo"
porto, e ainda somem com as tais vigas milionárias, para, provavelmente,
reutilizá-las depois, cobrando da prefeitura pela compra de novas. Basta
visitar algumas cidades dos EUA e da Europa para se confirmar que um viaduto
não precisa vir abaixo para se ressignificar um espaço e dar novas formas de
vida a ele. Mas essas outras maneiras provavelmente não iriam dar tanta margem
de lucros – financeiros e políticos – aos beneficiados com tamanha ordem de
investimentos.
O prefeito
Eduardo Paes levou seus filhos para passearem e assistirem ao espetáculo da
implosão da Perimetral, noticiada como uma obra magnífica para a zona portuária
da cidade. Paes deu entrevistas afirmando que a "Perimetral é o maior
símbolo da degradação do Rio", quando os verdadeiros símbolos de uma
cidade degradada são as emergências lotadas de hospitais públicos, onde pessoas
acabam falecendo por falta de assistência médica anterior aos problemas mais
graves; são as vielas de favelas com esgoto à céu aberto e lixo acumulado; são
os corpos de vítimas da violência do Estado que se empilham nos IMLs; são as
escolas malconservadas e com ares de sauna no calor carioca; são os mal-tratos
diários que os trabalhadores sofrem ao pegarem diariamente barcas, trens,
metrôs e ônibus sucateados, lotados e caros; são as prisões indignas e lotadas
de presos políticos, negros, pardos, moradores de comunidades, esquecidos pela
Justiça e pela sociedade.
Para fechar
com chave de ouro esse domingo sombrio, milhares de pessoas curtiram cegamente
o show, no Aterro do Flamengo, de celebridades da indústria cultural brasileira
pagas pelos patrocinadores da Copa 2014. Era o lançamento da camisa nova da
seleção e as pessoas que ali estavam sequer tinham informações mínimas para
questionar com os mais de R$ 30 bi para a Copa mais cara da história – em
segundo lugar vem a da Alemanha, que custou R$ 10,7 bi. Pulavam com seus corpos
dóceis na onda cega da euforia da Copa. E olhavam com ares de incompreensão para
os cartazes e faixas dos ativistas que ali estiveram para protestar contra a
"sujeira da Copa das empreiteiras".
Faixas com
os dizeres "Fifa go home" e "Copa pra quem?" foram
penduradas nas grades laterais do palco, e manifestantes circularam entre a
multidão com cartazes que pediam mais investimentos na saúde e na educação.
Dezenas de ativistas permaneceram próximos à frente do palco, cercados por
muitos PMs, e cantavam, entre uma música e outra dos shows, gritos de protesto,
como "Não vai ter Copa!" e "Da Copa, da Copa, da Copa eu abro
mão! Eu quero mais dinheiro pra saúde e educação". Ativistas mascarados
eram seguidamente parados pelos policiais, que solicitavam a identidade e a
retirada de máscaras e panos dos rostos.
Foto de divulgação Ocupa Lapa |
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